quarta-feira, 26 de março de 2014

A Ciência Precisa do Ateísmo? - Parte V

O QUE É EXATAMENTE CIÊNCIA?

O que vimos até aqui nos 4 artigos anteriores, é que existem 2 extremos a evitar. O 1º é enxergar o relacionamento entre ciência e religião unicamente em termos de conflito. O 2º é entender toda ciência como sendo filosófica ou teologicamente neutra. Seguimos daqui, analisando o que seja exatamente, a ciência. A seguir, trechos do livro:

A ciência explica. Para muita gente, essa frase resume o poder e o fascínio da ciência. A ciência nos capacita a entender o que antes não compreendíamos; e, ao nos proporcionar o conhecimento da natureza, confere-nos poder sobre ela. Mas quanto explica a ciência? Há limites?
Alguns acham que não e, no extremo materialista do espectro, estão os que sustentam que a ciência é a única maneira de conhecermos a verdade e que ela pode, pelo menos em princípio, explicar tudo. Essa visão se chama "cientificismo". Peter Atkins apresenta uma expressão clássica dessa visão: "Não há nenhum motivo para supor que a ciência não possa tratar de todos os aspectos da existência"(Natures Imagination: the Frontiers of Scientific Vision, pg. 125). Essa, em resumo, é a essência do cientificismo.
Aqueles que como Atkins defendem essa visão consideram todas as conversas sobre Deus, religião e experiências religiosas como estranhas à ciência e, portanto, não objetivamente verdadeiras. Eles admitem, é claro, que muitas pessoas acreditam em Deus; conseguem entender que pensar em Deus pode causar efeitos emocionais e até físicos, alguns dos quais podem ser benéficos. Mas, para eles, acreditar em Deus é como acreditar em Papai Noel, dragões, bichos-papões, ou fadas e duendes no fundo do jardim.
Richard Dawkins expressa essa ideia dedicando seu livro DEUS, UM DELÍRIO ... com uma citação: "Não é suficiente ver que um jardim é bonito sem precisar acreditar que no fundo dele existem fadas?"
O fato de alguém poder acreditar em fadas e se sentir encantado ou aterrado por elas não significa que elas existam. Portanto, os cientistas de quem estamos falando sentem-se satisfeitos em deixar que as pessoas sigam pensando em Deus e na religião, se isso lhes agrada, contanto que elas não afirmem que Deus possui alguma existência objetiva, ou que a crença religiosa constitui conhecimento. Em outras palavras, ciência e religião podem coexistir pacificamente, contanto que a religião não invada o reino da ciência. Pois somente a ciência pode nos dizer o que é objetivamente verdadeiro; somente a ciência pode transmitir conhecimento. O resultado final é este: a ciência trata da realidade, a religião não.
Alguns elementos desses pressupostos e alegações são tão bizarros que pedem uma resposta imediata. Tomemos a mencionada citação... apresentada por Dawkins. Ela entrega o jogo, pois mostra que Dawkins comete o erro de propor falsas alternativas, sugerindo que se trata de fadas ou de nada. As fadas no fundo do jardim podem muito bem ser uma ilusão, mas que dizer do jardineiro, para não falar sobre o dono do jardim? A possibilidade da existência deles não pode ser descartada de forma tão sumária. De fato, muitos jardins tem os dois.
Além disso, tome-se a alegação de que só a ciência pode transmitir a verdade. Se fosse verdadeiro, isso significaria o fim de muitas disciplinas em escolas e universidades. No caso, a avaliação da filosofia, da literatura, da arte e da música situa-se fora do escopo da ciência no sentido estrito. Como poderia a ciência nos dizer se um poema é ruim ou se é obra de um gênio? Certamente não seria mediante a medição do comprimento das palavras ou da frequência das letras que ocorrem nos poemas. Como poderia a ciência nos dizer se um quadro é uma obra-prima ou um confuso borrão de tintas? Com certeza não seria mediante uma análise química da tinta e da tela. Da mesma forma, o ensino da moral se situa fora da ciência. Esta pode nos dizer que, se adicionarmos estricnina à bebida de alguém, o veneno causará a morte da pessoa. Mas a ciência não pode nos dizer se é moralmente correto ou não colocar estricnina no chá de nossa avó no intuito de nos apoderarmos de seus bens.
Seja como for, a declaração de que apenas a ciência pode transmitir conhecimento é uma daquelas declarações contraditórias que especialistas em lógica como Bertrand Russell gostam de destacar: "Qualquer conhecimento que se possa conseguir, deve ser obtido por métodos científicos; e o que a ciência não pode descobrir a humanidade não pode conhecer."(Religion and Science, pg. 243). Para enxergar a natureza contraditória dessa declaração, apenas precisamos perguntar: Como Russell sabe disso? Porque sua declaração não é por si só enunciado científico! E, desse modo, se for verdade então - de acordo com essa mesma declaração - ela não pode ser conhecida - e mesmo assim, Russell acredita que ela seja verdadeira.



O BOLO DA TIA MATILDE

Talvez uma simples ilustração ajude a nos convencer de que a ciência é limitada. Vamos imaginar que minha tia Matilde tenha assado um belo bolo e que nós o levamos para que ele seja examinado por um grupo de cientistas de primeira linha. Eu, [John Lennox, o Autor] como mestre de cerimônias, peço-lhes uma explicação do bolo, e eles se põem a trabalhar. Os cientistas da nutrição nos darão explicações sobre a quantidade de calorias do bolo e seus valores nutricionais; os bioquímicos nos darão informações sobre a estrutura das proteínas, gorduras e outros componentes do bolo; os químicos, sobre os elementos envolvidos em sua composição; os físicos poderão analisar o bolo em termos de suas partículas fundamentais; e os matemáticos nos apresentarão sem dúvida um conjunto de elegantes equações descrevendo o comportamento daquelas partículas.
Agora que esses especialistas, cada um em relação a sua disciplina específica, nos deram uma descrição exaustiva do bolo, podemos dizer que ele foi explicado por completo? Com certeza recebemos uma descrição de COMO o bolo foi feito e de COMO seus vários elementos se relacionam entre si; mas suponhamos que eu lance ao grupo de especialistas uma questão final: POR QUE o bolo foi feito? O sorriso no rosto da tia Matilde mostra que ela sabe a resposta, pois ela fez o bolo e ela o fez com um propósito. Mas todos os cientistas da nutrição, os bioquímicos, os químicos, os físicos e os matemáticos do mundo não saberão responder a essa pergunta - e não é um insulto às disciplinas deles declarar sua incapacidade de responder a ela. As disciplinas de cada um, que podem dar conta das perguntas sobre a natureza e estrutura do bolo; que podem responder às perguntas sobre o COMO, não sabem responder às perguntas sobre o PORQUÊ relacionadas ao propósito para o qual o bolo foi feito. De fato, a única maneira que jamais teremos de obter uma resposta depende de uma possível revelação feita pela tia Matilde. Mas se ela não nos der a sua resposta, o fato puro e simples é que nenhuma quantidade de análise científica nos esclarecerá sobre esse ponto.
Afirmar como Bertrand Russell que, devido ao fato de a ciência não poder nos dizer por que a tia Matilde fez o bolo, nós não podemos saber por que ela o fez, é evidentemente falso. Tudo o que precisamos fazer é perguntar a ela. A alegação de que a ciência é o único caminho para a verdade é, em última análise, uma alegação indigna da própria ciência. Peter Medawar, laureado com o Prêmio Nobel, ressalta esse ponto em seu excelente livro CONSELHO A UM JOVEM CIENTISTA: 
"Não existe meio mais rápido para um cientista lançar descrédito sobre si mesmo e sua profissão do que declarar com franqueza - sobretudo quando nenhuma declaração de qualquer tipo se faz necessária - que a ciência sabe, ou em breve saberá, as respostas a todas as perguntas que merecem ser feitas, e que as perguntas que não admitem uma resposta científica são de certa forma 'não perguntas' ou 'pseudo-perguntas' que apenas os simplórios fazem e apenas os ingênuos professam saber responder."
"A existência de um limite para a ciência fica, todavia, evidente diante de sua incapacidade de responder a elementares perguntas infantis relativas ao início e o fim das coisas - questões tais como: 'como foi que tudo começou?'; 'para que estamos aqui?'; 'qual é a razão de viver?"
Ele acrescenta que é para a literatura imaginativa e para a religião que devemos dirigir na busca de respostas a essas perguntas. Francis Collins, diretor do Projeto Genoma Humano, também enfatiza isso: "O cientista é incapaz de responder a perguntas como 'por que o universo passou a existir?'; 'Qual é o significado da existência humana?'; 'Que acontece depois que morremos?'"(The Language of God). ...Não há nenhuma inconsistência ... em ser um cientista apaixonadamente comprometido no mais alto nível e ao mesmo tempo reconhecer que a ciência não pode responder a todos os tipos de perguntas, inclusive algumas das mais profundas que os seres humanos possam fazer.
...
O que estamos dizendo aqui é algo muito conhecido desde os tempos de Aristóteles, que de modo excepcional discriminou o que denominou as 4 causas: a causa material (o material que é feito o bolo); a causa formal (a forma em que os materiais são modelados); a causa eficiente (o trabalho da cozinheira tia Matilde); e a causa final (o propósito para o qual foi feito o bolo: o aniversário de alguém). É essa quarta causa de Aristóteles, a causa final, que se situa fora do escopo da ciência.
Austin Farrar escreve:
"Cada ciência escolhe um aspecto da realidade das coisas do mundo e mostra como ela funciona. Tudo o que se situa fora desse campo se situa fora do escopo da ciência. E sendo que Deus não faz parte do mundo, muito menos de um aspecto dele, nada do que se diga sobre Deus, por mais verdadeiro que seja, pode ser uma afirmação pertencente a alguma ciência."(A Science of God?, pg. 29).
À luz disso, as declarações de Atkins de que "Não há nenhum motivo para supor que a ciência não possa tratar de todos os aspectos da existência" e de que "não há nada que não possa ser entendido"(Creation Revisited, pg. 1), parecem completamente absurdas.
...
Uma coisa é sugerir que a ciência não pode responder a questões sobre o propósito final. Outra coisa completamente diferente é descartar o propósito em si como uma ilusão porque a ciência não consegue lidar com ele.
...O que destrói o cientificismo é a brecha fatal da contradição que nele existe. O cientificismo não precisa ser refutado por argumentos externos: ele é autodestrutivo... Pois a afirmação de que apenas a ciência pode levar à verdade não é deduzida da ciência [não provém dela]. Não é uma afirmação científica, mas sim uma afirmação acerca da ciência... Portanto, se o princípio básico do cientificismo for verdadeiro, a afirmação que expressa o cientificismo deve ser falsa. O cientificismo refuta a si mesmo, donde se conclui que é incoerente.
A visão de Medawar de que a ciência é limitada não é, portanto, nenhum insulto à ciência. O caso é exatamente o contrário. São aqueles cientistas que fazem alegações exageradas a favor da ciência que a levam a parecer ridícula. Talvez sem querer e talvez sem ter consciência disso, eles desviaram-se do fazer ciência para o criar mitos; e mitos incoerentes além de tudo.
Antes de deixarmos a tia Matilde, deveríamos observar que sua simples história nos ajuda a esquadrinhar outra confusão comum. Vimos como o raciocínio por si só não pode descobrir por que ela fez o bolo; ela precisa revelar-nos o motivo. Mas isso não significa que a razão a partir desse ponto seja irrelevante ou inerte. O que acontece é o contrário. Pois entender o que ela diz quando nos conta para quem fez o bolo requer o uso da nossa razão. Também precisamos da razão para avaliar a credibilidade da explicação dela. Se ela disser que fez o bolo para seu sobrinho Tiago e nós sabemos que ela não tem um sobrinho com esse nome, duvidaremos de sua explicação; se sabemos que ela tem um sobrinho com esse nome, então a explicação fará sentido. Em outras palavras, a razão não se opõe à revelação - simplesmente acontece que sua revelação do propósito pelo qual ela fez o bolo fornece à razão uma informação à qual a razão, SEM AJUDA, não tem acesso. Mas a razão é absolutamente essencial para processar essa informação. A ideia central é que em casos nos quais a CIÊNCIA não é nossa fonte de informação, não podemos de forma automática supor que a RAZÃO parou de funcionar e que as evidências já não são relevantes.
   Assim, quando os teístas alegam a existência de Alguém que mantém com o Universo a mesma relação que a tia Matilde mantém com seu bolo e que esse Alguém revelou por que o Universo foi criado, eles não estão de modo algum abandonando a razão, a racionalidade e as evidências. Estão apenas afirmando que há certas questões às quais a razão sem ajuda não pode responder, e que para respondê-las precisamos de outra fonte de informação - nesse caso, precisamos da Revelação de Deus, e para entendê-la e avaliá-la a razão é essencial. Era nesse espírito que Francis Bacon falava dos dois livros de Deus: o Livro da Natureza e a Bíblia. A razão, a racionalidade e as evidências se aplicam a ambos.



DEUS - UMA HIPÓTESE DESNECESSÁRIA?

A ciência tem alcançado êxito impressionante na investigação do Universo físico e na elucidação de como ele funciona. A pesquisa científica também levou à erradicação de muitas doenças horríveis e nos deu esperanças de eliminar muitas outras. E a investigação científica alcançou outro efeito numa direção completamente diferente: ela serviu para libertar muita gente de medos supersticiosos.  Ninguém precisa mais pensar que um eclipse da lua é causado por algum demônio assustador, que necessita ser apaziguado. Por tudo isso e por inúmeras outras coisas devemos ser muito gratos.
Porém, em algumas áreas, o próprio sucesso da ciência tem também conduzido à ideia de que, por conseguirmos entender os mecanismos do Universo sem apelar para Deus, podemos concluir com segurança que nunca houve nenhum Deus que projetou e criou este Universo. Todavia, esse raciocínio envolve uma falácia lógica comum, que ilustramos como segue.
Tomemos um carro motorizado Ford.
 É concebível que alguém de uma parte remota do mundo que o visse pela 1ª vez e nada soubesse sobre a engenharia moderna pudesse imaginar que existe um deus (o sr. Henry Ford) dentro da máquina, fazendo-a funcionar. Essa pessoa também poderia imaginar que quando o motor funcionava suavemente o Sr. Ford gostava dela, e quando ele se recusava a funcionar era porque o Sr. Ford não gostava dela. É óbvio que, se em seguida a pessoa passasse a estudar engenharia e desmontasse o motor, ela descobriria que não existe nenhum Sr. Ford dentro dele. Tampouco se exigiria muita inteligência da parte dela para ver que não é necessário introduzir o Sr. Ford na explicação do funcionamento do motor. Sua compreensão dos princípios impessoais da combustão interna seria mais que suficiente para explicar como o motor funciona. Até aqui, tudo bem. Mas se a pessoa então decidisse que seu entendimento dos princípios do funcionamento do motor tornavam impossível sua crença na existência de um Sr. Ford, que foi quem de fato projetou a máquina, isso seria evidentemente falso... Se nunca houvesse existido um sr. Ford para projetar os mecanismos, nenhum mecanismo existiria para que a pessoa entendesse.
Da mesma forma, é um erro... supor que o nosso entendimento dos princípios impessoais segundo os quais o universo funciona dispensa ou impossibilita a crença na existência de um Criador pessoal que projetou e sustenta o Universo. Em outras palavras, não deveríamos confundir os mecanismos pelos quais o Universo funciona nem com sua causa nem com aquele que o sustenta.
... Os que tem uma mentalidade científica como Atkins e Dawkins deixam de fazer uma distinção entre mecanismo e agência externa. ... Eles cometem um elementar erro... quando argumentam que, porque entendemos um mecanismo que explica um fenômeno particular, não há um agente que projetou o mecanismo.
Quando Isaac Newton descobriu a lei universal da gravidade, ele não disse: "Descobri um mecanismo que explica o movimento planetário, portanto não existe nenhum deus agente que o projetou". Ao contrário, precisamente por entender o funcionamento do mecanismo, Newton foi levado a sentir mais admiração pelo Deus que o projetara daquela forma!

(Trechos do capítulo 2 de Por Que a Ciência não Consegue Enterrar Deus, do matemático e pesquisador John Lennox. Ed. Mundo Cristão)
Continua...

quinta-feira, 20 de março de 2014

A Ciência Precisa do Ateísmo? - Parte IV



O LEGADO DE GALILEU

A doutrina da criação foi importante por dois motivos, sendo o primeiro já exposto no artigo anterior: importante para o surgimento da ciência devido a seu vínculo com a ordem do universo. O segundo motivo veremos a partir de agora, no prosseguimento aos extratos da obra sub-citada:


Para a ciência se desenvolver, o pensamento precisou libertar-se do onipresente método aristotélico de deduzir de princípios fixos como o universo deveria ser, avançando para uma metodologia que permitisse que o universo falasse diretamente. A mudança fundamental de perspectiva tornou-se muito mais fácil pela noção de uma criação CONTINGENTE, isto é, que o Deus Criador poderia ter criado o universo de qualquer modo que lhe aprouvesse. Consequentemente, para descobrir como o Universo realmente é ou como ele de fato funciona, não há alternativa para a qual voltar-se ou a analisar. Não se pode deduzir como o universo funciona simplesmente raciocinando a partir de princípios filosóficos em prioridade. Foi exatamente isso que fez Galileu, e mais tarde Kepler e outros fizeram: foram olhar... E revolucionaram a ciência. Mas, como todos sabem, Galileu meteu-se em encrencas com a Igreja Católica Romana.
...
Há importantes lições a inferir da história de Galileu. 1º, uma lição para aqueles que estão dispostos a levar o relato bíblico a sério. É difícil imaginar que alguém ainda credite que a Terra é o centro do universo com os planetas e o sol girando em torno dela. Aceita-se a visão heliocêntrica de Copérnico, pela qual Galileu lutou, e não se pensa que ela esteja em conflito com a Bíblia, embora praticamente todo mundo no tempo de Copérnico e antes dele pensasse como Aristóteles, que a Terra fosse o centro físico do Universo e fizesse uma leitura literal de partes da Bíblia para apoiar essa noção.  O que aconteceu para fazer a diferença?
Aconteceu simplesmente que agora se tem uma visão mais sofisticada, mais detalhada da Bíblia, e podemos ver que, quando por exemplo, a Bíblia fala do sol “surgindo”, ela está falando fenomenologicamente, isto é, fazendo uma descrição do que parece aos olhos de um observador, em vez de implicar um compromisso com uma teoria solar e planetária específica. Os cientistas de hoje fazem exatamente o mesmo: em suas conversas normais, eles também falam do “sol que surge”, e, em geral,  suas afirmações não são tomadas como eles sendo obscurantistas aristotélicos!
A importante lição é que devemos ser suficientemente humildes para diferenciar entre o que a Bíblia diz e a nossa interpretação dela. O texto bíblico... pode ser mais complexo do que inicialmente imaginamos e, em consequência, podemos correr o risco de usá-lo para apoiar ideias que ele nunca pretendeu ensinar.  Assim pensava Galileu em sua época, e a História mostra que ele estava certo.
Coube a Galileu, que acreditava na Bíblia, promover um melhor entendimento científico do universo, não apenas contra o obscurantismo dos religiosos da época, mas primeiramente contra a resistência e também obscurantismo dos filósofos seculares de sua época que, como os religiosos, também eram convictos discípulos de Aristóteles. Os filósofos e cientistas de hoje também precisam ser humildes à luz dos fatos, mesmo que esses fatos lhes sejam mostrados por alguém que em Deus. A ausência da crença em Deus não garante mais a ortodoxia científica do que a crença em Deus. O que está claro, na época de Galileu e na nossa, é que a crítica de um paradigma científico dominante está repleta de riscos, independentemente de quem está envolvido nela.

O CONFLITO REAL: NATURALISMO X TEÍSMO
Há um conflito, um conflito muito real, mas não se trata na verdade de um conflito entre ciência e religião. De modo nenhum; pois se assim fosse, a lógica elementar exigiria que todos os cientistas fossem ateus e que apenas os não cientistas acreditassem em Deus. Isso, como já vimos, simplesmente não acontece. O verdadeiro conflito se trava entre duas cosmovisões diametralmente opostas: o naturalismo e o teísmo. Elas inevitavelmente se chocam.
...O naturalismo se opõe ao sobrenaturalismo, insistindo que “o mundo da natureza deve formar uma única esfera sem incursões externas de almas ou espíritos, divinos ou humanos” (Oxford Companion to Philosophy, pg 604). ... O naturalismo [é], portanto, intrinsecamente ateu.
Carl Sagan expressou com econômica elegância nas palavras de abertura de seu aclamado seriado televisivo COSMOS: “O Cosmos é tudo o que existe, ou existiu, ou sempre existirá.” Essa é a essência do naturalismo... Assim, nada mais existe além da natureza. Trata-se de um sistema fechado de causa e efeito. Não existe uma esfera do transcendente ou sobrenatural. Não existe um “lado de fora”.
Diametralmente oposta ao naturalismo ... está a visão teísta do universo, que encontra sua expressão clara nas palavras de abertura do Livro da Gênese: “No princípio, Deus criou os céus e a terra.” (Gn 1.1). Aqui está uma asserção de que o universo não é um sistema fechado, mas uma criação, um artefato da mente de Deus, mantido e sustentado por Ele. É uma resposta à pergunta: Por que existe o Universo? É porque Deus ocasiona sua existência.
A declaração de Gênesis é uma declaração de fé, não uma declaração de ciência, exatamente como a asserção de Sagan não é uma declaração de ciência, mas de sua crença pessoal.
Que visão de mundo a ciência sustenta: o naturalismo ou o teísmo?
O cientista E. O. Wilson não tem dúvidas quanto à resposta: “O humanismo científico é a única cosmovisão compatível com o crescente conhecimento científico do mundo real e das leis da natureza”.
O estudioso de Química Quântica Henry Schaeffer III também não tem dúvidas em relação à sua resposta: “Deve existir um Criador. As reverberações do BIG-BANG e as subsequentes descobertas científicas apontam com clareza para uma criação ... consistente com os versículos de abertura do livro da Gênese”. (Ambos os testemunhos colhidos do artigo Science: Christian Perspectives for the New Millennium, em The Big Bang, Stephen Hawking and God).

Para apurar a relação entre as visões de mundo e a ciência, precisamos agora fazer uma pergunta surpreendentemente difícil: o que é exatamente CIÊNCIA? 


(Trechos do capítulo 1 de Por Que a Ciência não Consegue Enterrar Deus, do matemático e pesquisador John Lennox. Ed. Mundo Cristão)
Segue na Próxima Postagem...

domingo, 16 de março de 2014

A Ciência Precisa do Ateísmo ? - parte III

Prossigo na 3ª parte de uma série de artigos, questionando a presença do ateísmo na ciência. Como já exposto nos dois artigos anteriores, esses são textos selecionados e transcritos do excelente livro Por Que a Ciência não Consegue Enterrar Deus, do matemático teísta John Lennox, publicado no Brasil pela Ed. Mundo Cristão. Desfrute a continuação do debate e exponha suas opiniões no final.


AS RAÍZES DA CIÊNCIA QUE MUITOS ESFORÇAM-SE POR ESQUECER

Certamente a confissão de fé em Deus, mesmo quando feita por eminentes cientistas, não parece exercer nenhum efeito modulador sobre os tons estridentes anti-teístas empregados por apologistas ateus como Richard Dawkins, Peter Atkins, Sam Harris e outros que orquestram sua guerra contra Deus usando o nome da ciência. Talvez fosse mais correto dizer que eles estão convencidos não de que a ciência está em guerra com Deus, mas de que a guerra já acabou e a ciência obteve a vitória final. O mundo simplesmente precisa ser informado disto: Deus morreu e a ciência o sepultou, ecoando Nietzche. Seguindo essa linha, Peter Atkins escreveu: 
"Ciência e religião não podem reconciliar-se , e a humanidade deveria começar a apreciar o poder de sua cria e afastar todas as alternativas de acordo. A religião fracassou, e seus fracassos permanecem expostos. A ciência, com sua bem-sucedida busca de competência universal por meio da identificação do mínimo, o supremo deleite do intelecto, deveria ser reconhecida como rainha." (Nature's Imagination, The Frontiers of Scientific Vision).
Essa é uma linguagem triunfalista. Mas será que o triunfo está de fato garantido? Que religião fracassou? E em que nível? Embora a ciência seja realmente um deleite, ela será mesmo o SUPREMO deleite do intelecto? A música, a arte, a literatura, o amor e a verdade não tem nada a ver com o intelecto? Podemos ouvir o crescente coro de protesto  das humanidades...!
Mais ainda, o fato de existirem cientistas que parecem estar em guerra contra Deus não significa exatamente que a própria ciência esteja em guerra contra Deus. Por exemplo, Alguns músicos são ateus militantes. Isso significa que a música em sí mesma está em guerra? De modo algum. A ideia aqui exposta pode ser expressa da seguinte forma: Afirmações de cientistas não são necessariamente afirmações da ciência. Também poderíamos acrescentar que essas afirmações não são necessariamente verdadeiras; embora o prestígio da ciência seja tanto que elas muitas vezes, só por isso, são tomadas como tais. Por exemplo, as afirmativas de Richard Dawkins e Peter Atkins, com as quais começamos, se encaixam nessa categoria. Não são afirmações científicas, mas sim expressões de crença pessoal, na verdade de fé pessoal, não sendo diferentes - embora sejam visivelmente menos tolerantes - do que muitas expressões do tipo de fé que Dawkins deseja de modo expresso erradicar. Naturalmente, o fato de as citadas afirmações de Atkins e Dawkins serem afirmações de fé, não significa por si só que sejam falsas; mas sim, que elas não devem ser tratadas como se fossem fatos autorizados pela ciência.

Antes de avançar, precisamos, todavia, equilibrar um pouco as contas, citando alguns eminentes cientistas que de fato acreditam em Deus. John Houghton, condecorado com título de "Sir" pela Coroa Britânica, escreveu: 
"Nossa ciência é a ciência de Deus. Ele é responsável por toda a história científica... a notável ordem, consistência, confiabilidade e a fascinante complexidade presentes na descrição científica do universo refletem a ordem, consistência, confiabilidade e complexidade da atividade de Deus." (The Search for God: Can Science Help?)

 Ghillean Prance, (também condecorado Sir)... expressa de forma igualmente clara sua fé:
"Acredito há muitos anos que Deus é o grande arquiteto por trás de toda a natureza... Todos os meus estudo científicos a partir da quele tempo confirmaram minha fé. Considero a Bíblia como minha principal fonte de autoridade." (God and the Scientists, Mike Poole, 1997).
As afirmações que acabaram de ser apresentadas não são afirmações científicas, mas afirmações de crença pessoal. Deve-se notar, porém que elas contém certas sugestões em relação às evidências que poderiam ser aduzidas para sustentar essa crença. Temos assim a interessante situação em que, de um lado, intelectuais naturalistas nos dizem que a ciência eliminou Deus e, do outro lado, teístas dizendo-nos que a ciência confirma sua fé em Deus. As duas posições são defendidas por cientistas muito competentes. O que significa isso? Bem, significa com certeza que é uma atitude demasiado simplista pressupor que ciência e fé em Deus são inimigas, e sugere que valeria a pena explorar qual é exatamente a relação entre ciência e ateísmo e entre ciência e teísmo. Em particular, qual dessas duas cosmovisões diametralmente opostas (ateísmo e teísmo) tem de fato o apoio da ciência?



COMEÇAMOS PELA HISTÓRIA DA CIÊNCIA
É comum na literatura, primeiro, reconhecer as raízes da ciência contemporânea lá nos gregos do séc. 6 a.C. e, depois, mostrar que, para possibilitar o avanço da ciência, a visão grega teve de ser esvaziada de seu conteúdo politeísta... Embora os gregos, sob muitos aspectos, certamente tenham sido os primeiros a praticar a ciência mais ou menos da forma que a entendemos hoje... a visão real do Universo que mais ajudou a ciência, a saber: a visão hebraica de que ele foi criado e é sustentado por Deus, veio muito antes da visão de mundo dos gregos.
Isso deveria ser "proclamado do alto dos telhados", como um antídoto para uma sumária rejeição de Deus. Significa que a fundação sobre a qual repousa a ciência, a base a partir da qual sua trajetória se alastrou até os confins do mundo, tem uma forte dimensão teísta.
Vale a pena citar a frase de C.S. Lewis...: "Os homens se tornaram cientistas porque esperavam haver leis na natureza, e esperavam haver leis na natureza, porque acreditavam num legislador".  Foi essa convicção que levou Francis Bacon (1561- 1626), considerado por muitos como o pai da ciência moderna, a ensinar que Deus nos fornece 2 livros - o livro da natureza e a Bíblia - e que, para ser instruída de maneira apropriada, a pessoa deveria dedicar a mente ao estudo de ambos.
Muitas das proeminentes figuras da ciência concordaram com isso. Homens como Galileu (1564-1642), Kepler (1571-1630), Pascal (1623-1662), Boyle (1627-1691), Newton (1642-1727), Faraday (1791-1871), Mendel (1822-1884), Pasteur (1822-1895), Kelvin (1824-1907) e Clerk Maxwell (1831-1879) eram teístas. Em sua maioria eles eram, de fato, cristãos. Sua crença em Deus, longe de ser um empecilho para a ciência, era muitas vezes a principal inspiração para ela, algo que eles não tinham vergonha de afirmar. A força que impulsionava a mente inquisitiva de Galileu, por exemplo, era sua profunda convicção interior de que o Criador que nos "deu sentidos, razão e intelecto" pretendia que nós não "renunciássemos ao uso deles e que, por algum outro meio, obtivéssemos o conhecimento que por meio deles podemos adquirir"...
...A doutrina de um único Deus criador, responsável pela existência e pela ordem no Universo desempenhou um papel importante (contribuindo para o surgimento da ciência)...
...O surgimento da ciência teria sido seriamente retardado se uma doutrina particular de teologia, a doutrina da criação, não estivesse presente. Uma doutrina comum do judaísmo, cristianismo e islamismo... O simples fato de uma religião ter apoiado a ciência não significa que essa religião é verdadeira. Pois é exatamente isso, o mesmo que se poderia dizer do ATEÍSMO.

(Trechos do capítulo 1 de Por Que a Ciência não Consegue Enterrar Deus, do matemático e pesquisador John Lennox. Ed. Mundo Cristão)
Segue na Próxima Postagem...

domingo, 9 de março de 2014

A Ciência Precisa do Ateísmo? - parte II

O ÚLTIMO PREGO NO CAIXÃO DE DEUS (?)


Há uma impressão popular muito difundida de que cada avanço científico é mais um prego no caixão de Deus. Essa é uma impressão alimentada por influentes pensadores da ciência.

Peter Atkins, professor de Química e militante ateísta escreve: "A humanidade deve aceitar que a ciência eliminou a justificativa da crença num propósito cósmico, e qualquer sobrevivência desse propósito inspira-se apenas no sentimento." (artigo publicado em New Cientist, 08/08/1992, pg. 32-35).

Atkins, de um só golpe, reduz a fé em Deus não apenas a um sentimento, mas a um sentimento que se opõe à ciência. Ele não está só. Para não ficar para trás, Richard Dawkins, famigerado militante ateísta, vai além. Ele considera a fé em Deus um mal a ser eliminado: " Está na moda tornar-se apocalíptico acerca da ameaça para a humanidade apresentada pelo vírus da AIDS, pelo mal da 'vaca louca' e por muitas outras doenças, mas eu acho natural argumentar que a FÉ constitui um dos grandes males do mundo, comparável ao vírus da varíola, só que mais difícil de erradicar. A fé, sendo uma crença que NÃO SE BASEIA EM EVIDÊNCIAS, é o principal vício da qualquer religião." (Artigo publicado em The Humanist, jan/fev de 1997, pg 26-39).

A fé, na opinião de Dawkins, "graduou-se", deixando de ser um vício para tornar-se uma ilusão... Para Dawkins, Deus não é apenas uma ilusão. É uma ilusão perniciosa.
Visões como essa se situam num ponto extremo de um grande gráfico imaginário de posições... Muitos cientistas não se sentem nada satisfeitos com essa militância, sem mencionar os traços repressores e até totalitários dessas visões. Todavia, como sempre acontece, são as visões extremistas que chamam a atenção do público e são expostas na mídia, e o resultado disso é que muita gente conhece essas visões e é afetada por elas...

Considerando-se o que ele diz, está claro que uma das coisas que geraram a hostilidade de Dawkins em relação à fé em Deus é a lamentável impressão que adquiriu de que, enquanto "a crença científica se baseia em evidências publicamente verificáveis, a fé religiosa não apenas carece de evidências, mas sua independência de evidências é a sua alegria, proclamada do alto dos telhados" (transcrito de artigo publicado no Daily Telegraph Science, 11/09/1989).
Em outras palavras, ele considera toda fé religiosa como fé cega.

Mas, seguindo o conselho do próprio Dawkins, perguntamos: Onde estão AS EVIDÊNCIAS de que a fé religiosa não se baseia em evidências? Ora, é público e notório que, infelizmente, há pessoas que professam sua fé em Deus e adotam um evidente ponto de vista anticientífico. A atitude dessas pessoas desonra a Deus e deve ser deplorada. Talvez Richard Dawkins tenha tido a má sorte de cruzar com uma multidão muito grande dessas pessoas...!
Mas isso não altera o fato de que o cristianismo mais comum vai insistir que a fé e as evidências são inseparáveis. A fé é uma resposta às evidências, não um alegar-se na ausência de evidências. O apóstolo João escreve em sua biografia de Jesus: "Mas estes sinais foram escritos para que vocês creiam..." (Jo 20.31). Isto é, ele entende que o que está escrevendo deve ser considerado como parte das provas nas quais se baseia a fé. O apóstolo Paulo diz o que muitos dos pioneiros da ciência moderna acreditavam, a saber: que a própria natureza faz parte das evidências da existência de Deus:
 "Pois desde a criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua própria divindade, têm sido vistos claramente, sendo compreendido por meio das coisas criadas, de forma que tais homens são indesculpáveis." (Rm 1.20).
 Não faz parte da visão bíblica exigir que se acredite em coisas sem que haja nenhuma evidência. Exatamente como acontece na ciência: fé, razão e provas caminham juntas. A definição de fé apresentada por Dawkins como uma "fé cega" acaba sendo, portanto, o exato oposto da fé definida pela Bíblia. É curioso o fato de que ele não parece ter consciência da discrepância...! Seria isso uma consequência de SUA PRÓPRIA fé cega?

Assim, a definição de fé dada por Dawkins nos oferece um surpreendente exemplo do exato tipo de pensamento que ele afirma detestar: o pensamento que não se baseia nas evidências. Pois, mostrando uma assustadora incoerência, as evidências são exatamente aquilo que ele deixa de apresentar em defesa de sua alegação de que a alegria da fé resulta do fato de ela não depender de evidências. E a razão pela qual ele não apresenta essas evidências não é difícil de achar: elas não existem.

Não se requer muito esforço para averiguar que nenhum sério intelectual ou estudioso da Bíblia apoiaria a definição de fé apresentada por Dawkins. Francis Collins em seu livro A Linguagem de Deus diz que essa definição "com certeza não descreve a fé da maioria dos fiéis da história, nem da maioria dos que conheço pessoalmente".
O argumento de Collins é importante porque mostra que, rejeitando toda fé como cega, os neo-ateus estão minando seriamente sua própria credibilidade...

Dawkins deixou evidentemente de ocupar-se com quaisquer pensadores cristãos sérios. Que devemos então pensar de sua excelente máxima a seguir:
"Na próxima ocasião em que alguém lhe disser que algo é verdadeiro, por que não lhe responder: 'Que tipo de evidências disso existem?' E se não houver uma boa resposta, espero que você pense com muito cuidado antes de acreditar numa só palavra do que está ouvindo." (R. Dawkins, A Devil's Chaplain).

Facilmente será perdoado quem caísse na forte tentação de aplicar a máxima de Dawkins ao próprio autor - e não acreditar numa só palavra do que ele está dizendo...!


(Trechos do capítulo 1 de Por Que a Ciência não Consegue Enterrar Deus, do matemático e pesquisador John Lennox. Ed. Mundo Cristão)
Segue na Próxima Postagem...  

terça-feira, 4 de março de 2014

A Ciência Precisa do Ateísmo?


Será que nós e o Universo, com sua profusão de beleza galáctica e refinada complexidade biológica, nada mais somos que o produto de forças irracionais agindo, de uma forma desgovernada, sobre matérias e energias irracionais, como sugerem os chamados novos ateus, liderados por RICHARD DAWKINS? Será que, em última análise, a vida humana é apenas uma confessadamente improvável, mas mesmo assim fortuita, combinação de átomos dentre muitas outras possíveis?


Seja como for, como poderíamos de qualquer modo ser especiais, uma vez que agora sabemos que habitamos num minúsculo planeta, que gira em torno de uma estrela medíocre, pedida numa ramificação distante de uma galáxia espiralada, que contém milhões de estrelas semelhantes, uma galáxia que é apenas uma dentre outros bilhões de galáxias distribuídas pela vastidão do espaço?

Mais ainda, dizem alguns, já que certas propriedades básicas do nosso Universo, como o poder das forças fundamentais da natureza, e a quantidade de dimensões observáveis de espaço e tempo resultam de efeitos aleatórios que atuam na origem do Universo, então, com certeza, é bem possível que existam outros universos com estruturas muito diferentes. Será que o nosso Universo é o único nesse vasto conjunto de universos paralelos eternamente separados entre si? Não seria, portanto, absurdo sugerir que os seres humanos têm alguma importância suprema? A medida deles num multiverso pareceria efetivamente reduzida a zero.
 Sendo assim, do ponto de vista intelectual, seria um absurdo exercício de nostalgia relembrar os primórdios da ciência moderna, quando cientistas como Francis Bacon, Galileu, Newton, por exemplo, acreditavam num Deus criador inteligente, de cujo cérebro nascera o cosmos. A ciência avançou afastando-se desse pensamento primitivo, assim nos dizem. Deus foi posto de lado, morto e depois sepultado pelas onipresentes explicações científicas... Ele sem dúvida está morto. Além disso, todo o processo de sua morte mostra que qualquer tentativa de reintroduzir Deus vai provavelmente atrapalhar o progresso da ciência. Podemos agora ver com mais clareza do que nunca que o NATURALISMO – a concepção de que a natureza é tudo o que existe, de que não há nenhuma transcendência – reina soberano.

Em um congresso científico realizado em 2006... Discutindo se a ciência deveria descartar a religião, o prêmio Nobel Steven Weinberg disse: ”O mundo precisa acordar do longo pesadelo da religião. Nós cientistas devemos fazer tudo o que nos seja possível para enfraquecer o domínio da religião, e esse talvez seja de fato nosso maior legado para a civilização”. Sem causar nenhuma surpresa, Richard Dawkins foi ainda mais longe: ”Estou cheio até as tampas do respeito que, por meio de uma lavagem cerebral, fomos induzidos a nutrir pela religião”.


...Isso é realmente verdadeiro? Deveriam todas as pessoas religiosas ser rejeitadas por serem preconceituosas e mal informadas? Afinal de contas, algumas dentre elas são cientistas laureados com o prêmio Nobel. Será verdade que elas de fato confiam cegamente que um dia será descoberto um canto escuro do Universo que a ciência nunca poderá iluminar? Com certeza essa não é uma descrição justa ou verdadeira da maioria dos pioneiros da ciência, que, como Kepler, alegavam que era exatamente sua convicção da existência de um Criador que inspirava sua ciência a empreender voos cada vez mais altos. Para eles, eram os cantos escuros do Universo DE FATO iluminados pela ciência que ofereciam amplas evidencias da engenhosidade de Deus.


...Seria o naturalismo de fato exigido pela ciência? Ou será que é simplesmente concebível que o naturalismo seja uma filosofia ADICIONADA À CIÊNCIA, mais do que algo imposto por ela? Alguém poderia ousar perguntar se o naturalismo não seria talvez uma expressão de fé, semelhante à fé religiosa. Quem assim pensasse poderia no mínimo ser perdoado, considerando-se a forma como são tratados os que ousam tratar questões desse gênero. Como os hereges religiosos de outrora, eles podem sofrer uma forma de martírio, representada pelo corte de suas bolsas de pesquisa...!


...Na Idade Média ... a ciência precisou livrar-se de certos aspectos da filosofia aristotélica antes de poder realmente ganhar impulso... Galileu observou através de seu telescópio... e parte da dedução de Aristóteles referente a seu conceito ...caiu por terra!... Kepler fez a sugestão inovadora de que os planetas se movimentam em elipses “perfeitamente” iguais em torno do Sol em um dos focos, visão ... mais tarde ... esclarecida pela lei do inverso do quadrado da atração gravitacional de Newton...


Kepler havia mudado a ciência para sempre, desatrelando-a da inadequada filosofia a que fora confinada durante séculos. Seria, talvez, um pouco PRESUNÇOSO supor que um passo libertador como esse NUNCA MAIS precisará ser dado!


Contra isso cientistas como Atkins e Dawkins argumentarão que, desde os tempos de Galileu, Kepler e Newton, a ciência vêm mostrando um crescimento exponencial e não há evidências de que a FILOSOFIA do naturalismo ... seja inadequada. De fato, na opinião deles, o naturalismo serve apenas para promover o avanço da ciência, que agora pode seguir em frente livre do estorvo da bagagem mitológica que, no passado, muitas vezes a deteve....

Mas será que o caso é realmente esse? ...Nem Galileu, nem Newton, nem de fato a maioria das grandes figuras científicas que contribuíram para a meteórica ascensão da ciência na sua época achavam que a crença num Deus criador fosse inibidora nesse sentido. Longe disso, eles a consideravam positivamente estimulante: na verdade, para muitos deles, ela era a principal motivação para a investigação científica. Sendo assim, a veemência do ateísmo de alguns autores contemporâneos levaria alguém a perguntar: Por que eles estão agora tão convencidos de que o ateísmo é a única posição intelectualmente defensável? É realmente verdade que no campo da ciência tudo aponta para o ATEÍSMO? A ciência e o ateísmo são companheiros tão naturais?


...Que cosmovisão se coaduna melhor com a ciência: O teísmo ou o ateísmo? A ciência sepultou ou não sepultou Deus? Vejamos onde as EVIDÊNCIAS vão dar...



(Trechos do prefácio de Por Que a Ciência não Consegue Enterrar Deus, do matemático e pesquisador John Lennox. Ed. Mundo Cristão)

Assistamos os próximos capítulos...